O pirarucu do meu pai, adaptado, bom para acolher... |
Quando eu era criança, a maior parte das vezes quem cozinhava em casa era meu pai. Sempre tivemos uma ajudante, pois minha mãe trabalhava fora e longe de casa. E com quatro irrequietas crianças e um quintal cheio de árvores, dá para imaginar a confusão. E sim, não tinha computador nem filminhos viciantes na TV. Aliás, quando eu era muito pequena, nem TV. Era correr para escutar as novelas do rádio, grudada para não perder nada, subir em árvore, andar de bicicleta, jogar futebol com os irmãos, ler muito e brincar, brincar e brincar.
Meu pai tinha trabalhos mais próximos de casa e nunca deixou de meter a colher, ou melhor, todas as colheres, na comida das ajudantes. E cá entre nós, a comida dele sempre foi mais gostosa. O feijão com jabá e banana comprida insuperável, o repolho cortado o mais fino possível para a salada e os bifes caprichosos sempre foram uma alegria. E no dia que tinha pirarucu com leite e batatas, pra mim era dia de festa.
Eu era muito enjoada pra comer. Eram tantas as restrições que eu fazia, que sobravam apenas bife, arroz e salada. A salada e o feijão, ambos do meu pai, comidas em tigelas separadas. Não me lembro de bacalhau quando criança, apesar do meu avô português. Mas o pirarucu que o meu pai fazia, sim, sempre. Ele o preparava numa panela enorme, cheio de batatas e cebola. Não usava leite de coco, acho. Eu não tomava leite de vaca, mas uma vez perguntei e acho que era o leite com o qual ele fazia o pirarucu. E eu adorava.
Esses dias tive a alegria de acompanhar a chef Mara Alcamim, chef e proprietária do restaurante Universal Diner, de Brasília, que veio a convite do Governo do Estado do Acre e Federação das Indústrias, com o apoio de vários parceiros, ministrar oficinas e palestra. Levei-a, é claro, para conhecer as delícias da terra e fomos à Ceasa e depois ao Mercado. Foi um divertimento acompanhá-la, enchendo as sacolas de compras, do feijão à goma, açúcar mascavo, jambu e tudo o mais que encontrou de diferente.
Não resisti e comprei um lindo filé de pirarucu, para mim, até hoje, comida de alma, como diz a escritora Nina Horta. Comida para acolher e cuidar. E após esta semana, em meio a uma crise de Ler/Dort, lembrei-me do pirarucu. E pedi à minha fiel escudeira Ivone que o cortasse e dessalgasse. Com as verdurinhas cortadas e a carne já com o sal na medida, fazê-lo é muito simples. Usei o leite da nossa castanha, hidratada antes e batida na hora, para não fermentar. Os acompanhamentos ficam a seu gosto. Usei cebolas, tomates cereja, couve e batatas. Um arrozinho branco e o conforto de uma comida simples, carregada de referências afetivas. Igual abraço. Faça e convide os amigos e os familiares, fica uma delícia!
Pirarucu ao leite de castanha do Brasil
Ingredientes
Para o pirarucu
Aproximadamente 450 g de pirarucu já dessalgado, cortado em pedaços não muito grandes, escorridos
01 cebola roxa média, cortada em cubinhos bem pequenos
02 dentes grandes de alho, amassados
02 colheres de sopa de azeite
03 cebolas descascadas (usei a roxa, mas podem ser brancas), cortadas em quatro, cada
04 folhas de couve, cortadas em pedaços grandes, com os talos
tomates cereja, a gosto, ou tomates médios, cortados em quatro
03 batatas médias, descascadas e cortadas em pedaços grandes
Cebolinha para enfeitar depois de pronto
Ovos cozidos e azeitonas pretas (a gosto, opcionais). Não usei desta vez.
08 a 10 castanhas do Brasil cruas, deixadas de molho em água, batidas na hora com 1 xícara de água quente
Modo de fazer
Numa panela de barro ou uma de fundo grosso, coloque o azeite e em seguida o alho, mexendo um pouco. Coloque a cebola roxa picadinha e deixe suar. Arrume as postas do filé de pirarucu já dessalgado (ou do peixe sem peles e espinhas, já dessalgado, caso não use o filé) e por cima arrume as cebolas, a couve, os tomates e batatas. Bata as castanhas com a água quente e se desejar, coe. Vá acrescentando à panela aos poucos, para que o peixe e as verduras/legumes cozinhem no líquido. Se desejar acrescente os ovos cozidos e azeitonas. Prove o sal. Tampe a panela e deixe cozinhar até que estejam macias as verduras e legumes, sem desmanchar. Enfeite com cebolinha picada. Sirva com arroz branco.