sábado, 21 de maio de 2016

BOLO DE COMER REZANDO



O bolo, enfeitado com lâminas de castanha do Brasil e calda adicional...


Talvez uma das coisas que mais me dêem prazer, além de cozinhar, seja folhear meus livros e revistas de culinária, garimpados literalmente em sebos, bancas de revista escondidas e livrarias. Por eles passam a minha história, a história da minha vida, meus sucessos, meus fracassos, o nascimento dos filhos, o bolo que fiz para uma amiga doente, os biscoitinhos preferidos de um dos amigos do filhote mais velho, as invenções culinárias, os sonhos e as esperanças.

De vez em quando, se me sobra um tempinho, vou cavucando meus velhos livros e revistas, receitas antigas e outras nem tanto, pedaços de papel escritos à mão, velhas cópias xerox que nem sabem quanta alegria deram aos afortunados que as provaram. As receitas, digo. Hoje, procurando uma matéria antiga perdida nesse oceano, lá fui eu estante por estante, repassando memórias...

E começaram a desfilar pelas minhas mãos guardados antigos e entre estes uma das primeira revistas que guardei, ainda grávida do meu filho mais velho. Lá fui eu lembrar do dia em que o pequenino, hoje já com vinte e oito anos, resolveu passar as páginas não sem antes dar sua contribuição infantil: tirou-a do cesto em que lá ficava e arrancou uns pedaços, para meu desespero e total impossibilidade de detê-lo a tempo...

A geleia de maracujá que tantas vezes fiz para o café da manhã dos pequenos lá estava, garbosa nas páginas de comidas brasileiras...e a revista italiana traduzida, com um anexo de doces tradicionais com o uso do leite moça, me permitiu testar o primeiro pão. Era um pão de leite cuja massa ficou linda e montei as bolinhas na assadeira já antevendo o prazer da degustação. Mas, nessa época não sabia que a maioria dos pães precisa fermentar duas vezes. Então, coloquei as lindas massinhas no forno, que é claro, viraram umas palanquetas brancas...para quem não sabe, palanquetas são aquelas bolinhas que se faz com barro para usar nas baladeiras,  hoje nem um pouco politicamente corretas. Joguei tudo fora e demorei a tentar de novo fazer pão.

Havia ainda relativamente poucas revistas de culinária quando comecei a colecioná-las e algumas não estavam muito disponíveis.  Lembrei disso ao conhecer semana passada dois integrantes da revista gastronômica Prazeres da Mesa, em visita ao estado do Acre, minha terra natal e onde moro hoje, depois de vinte anos residindo no Ceará. Vieram a repórter especial Isabel Raia e o editor de fotografia Ricardo D' Ângelo, para uma série de visitas às empresas locais, que culminou em um jantar-degustação e aula-show com o chef Alexandre (Sassá), do Sassá Sushi, de São Paulo, utilizando as proteínas animais produzidas aqui na região (ave, porco, cordeiro e peixes), no restaurante La Nonna. O jantar foi um sucesso total, com gosto de quero mais. 

Adorei conhecê-los e morri de pena de já irem embora de madrugada, mas ficou a promessa de voltarem para que possamos apresentá-los aos nossos mercados e outros cantinhos mais. Leio a revista desde o seu primeiro número, quando ainda morava no Ceará. Lembrei do dia em que, tão ansiosa estava para comprar a última edição em banca, nessa época disponível em poucos lugares, que  me joguei no ônibus até a livraria do aeroporto de Fortaleza, nem consegui esperar a carona. 

Essa história me rendeu um mimo da revista, até hoje uma de minhas preferidas, pelo ineditismo de suas publicações e por ter tido a ousadia de correr o país e mostrar o Brasil que os brasileiros não conhecem...isso há muitos anos, desde suas primeiras páginas publicadas, seus festivais ao vivo, seu colorido e vivacidade. O editor, é claro, publicou a história mas suprimiu o ônibus, imagina se alguém vai acreditar nisso...só os loucos por cozinha entendem. Fiquei tão feliz que saí mostrando para todo mundo, na época!   

Uma vez, ainda no Ceará,  encontrei uma banca de revista que parecia uma caverna: úmida, cheia de mofo e a proprietária, uma senhora já de idade, estava sempre sentada em um banquinho do lado de fora. Ficava se não me engano,no caminho do Campus do Pici/UFC e vendia livros e revistas usadas a quem se dispusesse a procurar, naquele espaço meio surreal e mal-cheiroso. Em época de dinheiro curto, quem ligava? E foi lá que comprei um livro da Patrícia Wells, escritora e jornalista americana apaixonada pela França, que até hoje me acompanha, por inacreditáveis R$ 5. 

Por essas páginas garimpadas aqui e ali aprimorei minhas comidinhas, inventei receitas, aprendi temperos novos. Li sobre técnicas e sonhei acordada com restaurantes e mercados. Experimentei novos sabores e li e reli inúmeras vezes receitas, depoimentos e estórias de quem, como eu, se emociona com a cultura gastronômica, com as receitas da mãe e do pai, com os encontros de família regados a comidinhas especiais e cheios de especialidades secretas daquela tia ou avó. 

Até hoje gosto de comprar revistas e livros de culinária, em especial os que tem por trás das receitas uma filosofia de vida, uma história. Por isso, ao folhear distraidamente um dos meus livros, encontrei uma cópia quase apagada de um bolo de chocolate que eu fazia há uns vinte anos atrás. Minha mãe havia me dado de presente um daqueles multiprocessadores modernos, quando a visitei no Acre, logo depois de ter ido residir no Ceará. Mas eu terminei queimando o coitado quando fui usar, pois a voltagem no Acre é diferente da de Fortaleza e eu, distraída, liguei direto na tomada. Junto com ele vinha um livro de receitas que desapareceu misteriosamente da minha casa.

Mas o bolo era delicioso e tanto fiz, que consegui uma amiga que tinha o tal folheto e aí reproduzi-o. Alguns anos depois, resolvi melhorar o orçamento de casa vendendo lanchinhos para os colegas de trabalho, que me esperavam com ansiedade total. Não havia lanchonetes por perto e nem tínhamos muito tempo de intervalo. Quando eu chegava com aquele bolo cheio de calda ou pães quentinhos, eles vinham correndo reservar seu lanche. Troquei a margarina e o achocolatado da receita, que não entram aqui em casa, por manteiga e chocolate. Se você desejar uma calda mais fina, coloque um pouquinho a mais de leite e também umas colheres de sua bebida preferida. Ao ferver, o álcool evapora e deixa a calda mais perfumada. Bom apetite! 

Bolo molhadinho de chocolate

Ingredientes

Para o bolo

200 g de manteiga sem sal
1 1/2 xícara de açúcar refinado
1 pitada de sal
2 ovos inteiros, em temperatura ambiente
1 xícara de chá de leite em temperatura ambiente
2 xícaras de chá de farinha de trigo, peneiradas
1 xícara de chá de chocolate em pó (se gostar muito de chocolate, pode usar o cacau em pó, fica bem forte)
1 colher de sopa de fermento químico

Para a cobertura

1/2 xícara de chá de chocolate em pó 
1 xícara de açúcar refinado
2 colheres de sopa de manteiga sem sal
4 a 6 colheres de sopa de leite (ou um pouquinho mais, se desejar mais fina)
2 colheres de sopa da bebida de sua preferência (opcional)
lascas de castanha do Brasil, para enfeitar (opcional)

obs: se desejar, faça metade da calda à parte, para servir junto com o bolo, se desejar mais molhadinho

Modo de fazer

Para o bolo

Numa tigela, coloque a manteiga e o açúcar. Acrescente a pitada de sal e bata até virar um creme. Coloque um ovo de cada vez e bata mais a cada adição. Acrescente alternadamente a farinha, leite e o chocolate e bata rapidamente, apenas para misturar. Acrescente o fermento e misture. Coloque na assadeira untada e polvilhada e leve ao forno médio até assar. Retire do forno, desenforme se desejar e imediatamente despeje a calda fervente por todo o bolo. Deixe reservado até esfriar. Se desejar, faça mais um pouco da calda e ao servir, regue os pedaços com colheradas adicionais e enfeite com a castanha (usei a castanha fatiada da Miragina, sem sal, mas se não tiver, corte uma castanha crua em lâminas bem finas). Sirva.

Para a calda

Coloque todos os ingredientes numa panela de fundo grosso e mexa até que ferva e fique homogênea. Desligue o fogo e despeje com cuidado sobre o bolo quente.

Para saber mais:

Anac - www.anac.gov.br

Sassá Sushi - www.sassasushi.com.br

Peixes da Amazônia - www.peixesamazonia.com.br

Acreaves e Dom Porquito - http://www.sba1.com/noticias/pecuaria-de-corte/48057/acre-deve-avancar-em-2015-nas-cadeias-produtivas-de-carne-de-frango-e-suina#.V0C3AvkrJdg

Cordeiros da Amazôniahttps://www.facebook.com/frigorificoannasara2013

Revista Prazeres da Mesa - www.prazeresdamesa.com.br

Grupo 5 - www.grupo5bs.com.br

Miragina - www.miragina.com.br

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