terça-feira, 30 de agosto de 2011

DIA DE FESTEJAR, POR QUE NÃO?




Tenho dois lindos filhos. Amorosos, solidários e tão perfeitos como o amor de mãe os tornam, sempre. Aqui e ali nos estranhamos um pouco, nada de muito grave nem que um bom pedido de desculpa não resolva. Com o mais velho, cumplicidade absoluta.  Nos entendemos quase sem precisar falar. Com o mais novo, disputas de lá e de cá e queda de braço quase permanente. É teimoso igual à mãe, o danado. Pouco argumento com ele não serve. Antenado, twiteiro, informado sobre tudo o que esses tempos modernosos exigem. Resolveu, agora, além do inglês, fazer alemão e está estudando na escola sobre nazismo e as atrocidades cometidas por Hitler. Motivo mais do que justo para assistirmos ontem ao filme  “O Julgamento de Nuremberg” (2000), ele adorando dormir quase a uma da manhã em plena segunda-feira... com direito a massagem nos pés, ainda que só um pouquinho, pela mãe cansada...
O mais velho bandeou-se este ano para a cidade natal, Fortaleza. Nos preparamos juntos por vários meses e mesmo assim tem dias em que sinto uma saudade maior do que eu. Quando faço café e o cheiro toma conta da casa lembro sempre dele e do seu cafezinho de fim de tarde. Antes, tomava com o leite gelado. Agora, sofisticou-se e já o esquenta um pouco, nada que queime a língua, para sentir melhor o sabor.
Ambos adoram cappuccino. E bolo de cenoura, pão caseiro com geléia para o mais velho e com requeijão para o mais novo, macarrão cortado em tiras finas e cozido al dente no prato fundo com manteiga e pimenta, pudim de leite e torta de maçã, arroz soltinho cozido com folha de louro, um bife na panela de ferro... O mais novo come com a fome dos quinze anos e o divertimento preferido é abrir a geladeira. Passa, abre, olha, escolhe e aí recomeça tudo de novo. O mais velho é seletivo, só não resiste aos bolinhos e doces feitos pela mãe...
Hoje é dia de festejar: meu filho mais velho entrou para o rol dos rapazes sérios e está de namorada. Não sei as outras mães, mas estou tão feliz que resolvi escrever. Afinal, aquele garotinho que eu pegava no colo cresceu e uma nova fase se inicia. Lembro ainda da primeira vez que uma garota me chamou de tia: eu morava em Fortaleza, estava no banheiro de um shopping e ouvi de repente o pedido: _ “Tia, me empresta o batom?”
Olhei para mim no espelho e não consegui ver nenhuma tia, mas mesmo assim emprestei o batom, só não esqueci aquela sensação de que o tempo, esse cidadão, estava passando bem ao meu lado. Vejo que ele  continua a passar, mas sinto uma grande alegria: meu filho mais velho já está preparado para seguir em frente. E agora, com uma companheira.

PUDIM DE LEITE CONDENSADO
Ingredientes
Para a calda:
1 xícara de açúcar cristal ou refinado derretido direto na forma, em fogo baixo.
Para o pudim:
1 lata de leite condensado (eu só uso Nestlé, perdoem-me a propaganda)
3 ovos
1 medida mais dois dedos de leite, medidos na lata de leite condensado

Modo de fazer:

Derreter o açúcar na forma e com cuidado, espalhar bem;
Liquidificar o leite condensado, os ovos e o leite;
Despejar na forma e colocar no forno, sem banho-maria, por aproximadamente 30 a 40 minutos. (Faça um teste, enfiando uma faca nas extremidades. Se sair seco, está bom);
Aguarde esfriar bem e desenforme, colocando-o na geladeira.

P.S: se você tiver um marido e filhos como os meus, faça uma receita dupla.


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

LEMBRANÇAS E SALTENHAS…

  FOTO: ACERVO MIRAGINA 
A antiga Lanchonete Miragina, ao lado do quartel: …todos os dias meu encontro com o sabor!
 
            Não sou jornalista. Portanto, como não é dever de ofício, gosto de escrever quando tenho vontade, quando as histórias ficam empurrando com força a portinhola que dá acesso ao coração e pedem mesmo para sair e olhar a luz do sol. Por isso demoro tanto pra iniciar a escrita e muitas vezes, de perfeccionista que sou, desmonto qualquer palavrinha mais metida, que saiu pela portinha assim meio que sem licença, só de vontade de dar uma volta. 

            Tenho a maior inveja de quem senta, pega uma pauta, sofre um pouco, mas organizadamente, produz ou faz nascer um texto que muitas vezes encanta a quem o lê, às vezes numa calma manhã de domingo, com uma bela xícara de café nas mãos e um som de passarinhos no quintal. Eu, não. Para que as letrinhas se arrumem no papel, o coração tem que estar envolvido e como escrevo sobre histórias e comida, os sabores e as lembranças precisam passear em volta, dar o ar da graça…

            Meu maridinho é um desses, um dos bons. Como eu orgulhosamente fui nomeada sua editora, sempre leio seu texto em primeira mão, o que não significa que é fácil: como toda boa queda de braço entre dois cidadãos opiniosos, eu e ele, enquanto o leio, ele fica assim como que um buldogue a quem se quer tirar o osso. Aceita sugestões, é claro, mas os estilos são diferentes e ele fica ali do lado, com o rosnado preparado. 

           Sempre nos entendemos bem e poucas vezes precisei ficar calada ou desgostar do que li. Houve apenas um ou dois momentos, nesses tempos de edição amadora, em que ele preferiu reescrever tudo e o fez de forma tão linda que me provocou lágrimas nos olhos. Os homens são assim, mesmo os muito sensíveis. Meio turrões, meio caladões de fora pra dentro, ainda que só o perceba quem os conhece. Há que ter paciência, são pessoinhas que merecem respeito.

www.miragina.com.br 
Biscoitos de Castanha: uma tradição acondicionada em charmosas latinhas…

            Mas esse texto, ainda que para elogiar os bons jornalistas, dos quais tenho tantos e tão honrosos exemplos, como  meu querido Elson Martins, um mestre, é mesmo para falar do meu processo criativo. Tentar colocar em palavras aquilo que o sentimento expressa por vias curvas ou não tão retas: um bolinho para um amigo, um mingau, aquele bife com cebolas, a farofa de ovos que só a mãe sabe fazer… comida, como já se vê, de alma, que fala de conforto, que coloca o nosso pé numa meia quentinha, no colo das pessoas queridas. Essa é a comida que me dá mais prazer e é a comida sobre a qual eu gosto de falar.

            Nada contra as experimentações, o moderno,  a técnica, as medidas exatas. Cada alquimista no seu caldeirão. Estou falando de tudo isso para lembrar que um dia desses fui à Confeitaria Rosamélia comprar saltenhas assadas, daquelas que desde criança me acostumei a comer quentinhas, com um creme de frango borbulhante dentro, pedacinhos de batata e uma azeitona verde para dar o tom. Levei dois depósitos, pois elas iriam para longe, satisfazer paladares distantes.

FOTO: PATRYCIA COELHO 
A saltenha Creolla: uma novidade, com o sabor da pimenta delicadamente amenizado pela doçura das passas… 

A simpática atendente deve ter visto em meus olhos a percepção da gula, pois me ofereceu um novo sabor, a creolla, com carne picadinha, ovo cozido em pedacinhos minúsculos, passas e uma pimenta… ai, a pimenta! Para fortes e corajosos, dessas que vão até a alma… mas, uma verdadeira delícia, depois que as papilas se acostumam à novidade. A confeitaria serve outras guloseimas como biscoitos de castanha, pães, bolos,  sucos e docinhos.  
 
            Lembrei-me da Lanchonete Miragina, dos mesmos donos, nos idos de 80, localizada na então Praça Plácido de Castro. O grupo, familiar e tradicional na cidade, foi pioneiro na fabricação de massas e biscoitos, estes também acondicionados hoje, além da embalagem tradicional, em charmosas latas, prontas para viagem e presente.

            Não conheci o patriarca, seu Abrahão. Mas lembro perfeitamente de dona Mirian Felício, sempre elegante, supervisionando tudo. 

            A antiga lanchonete, um espaço amplo no Centro, moderno, foi meu ponto preferido para pequenos lanches durante o tempo em que trabalhei no extinto BNH, pertinho do estádio José de Melo. O BNH foi extinto, a praça mudou de nome e a lanchonete deu origem ao primeiro shopping do Acre, o Mira, mas as saltenhas continuam a viajar apertadinhas nos depósitos ou embaladas caprichosamente uma a uma para confortar o apetite saudoso de quantos a tenham conhecido, acreanos ou agregados. E continuam a encantar as novas e as não tão novas gerações, que batem o ponto todos os dias para degustá-las.

DO LIMÃO NÃO SAI SÓ LIMONADA…

 
 
 
     "Das inúmeras associações que a comida possa trazer para alguém, talvez a mais prazerosa, seja a que remeta esse alguém para um cantinho perdido na memória e no tempo onde o mingau ou biscoito especial evoca também o carinho da mãe, o cuidado da avó, a hora do lanche sentado na varanda de casa e tantas outras lembranças particulares.


     A lembrança mais antiga relacionada à comida, que ora me ocorre, é a do mingau quentinho servido em mamadeira, que minha mãe me trazia todos os dias pela manhã antes mesmo de eu levantar para ir à escola. Por um daqueles imprevistos que têm o poder de mudar o rumo da história, desisti daquela gostosura. Por esquecimento ou pressa, não me lembro mais, deixei de tomar no horário devido o tal mingau e eis que na escola, minha mãe apareceu de mamadeira em punho preocupada com a saúde da filha mais velha, logo eu, uma "adulta" de cinco anos. A vergonha foi tanta que nunca mais permiti que fosse feito o mingau, retirado precocemente da minha dieta da madrugada.

                               

   

Mais ou menos na mesma época, lembro que minha mãe fazia em casa uns biscoitos de maisena assados em tampas de panela, pois assadeira

naquele tempo, era luxo e desconhecimento. Mal a fornada saía, o bando de meninos avançava em cima, sem ao menos dar tempo para que eles esfriassem. Quando viriam outros? Biscoito de gordura "trans" ainda não existia, ou pelo menos nós não conhecíamos.


     Havia ainda um senhor moreno e bem alto, vestido sempre de branco, que de vez em quando passava na rua com um tabuleiro de madeira na cabeça a vender amendoim e açúcar "preto”. Nossa obrigação era avisar mamãe a tempo, para que os ingredientes do pé-de-moleque estivessem garantidos. Lembro dele até hoje, com seu passo manso, descendo o tabuleiro coberto e nós, os irmãos, a sonhar com o doce acrescido de leite condensado, cortado em quadradinhos melosos… 


 Ontem e hoje: o antigo Mercado das recordações gastronômicas da Patrycia…


     Minhas primeiras saídas para o centro, ou melhor, para o "comércio", estão mentalmente ligadas a uma lojinha no Mercado, cuja dona tinha na porta da geladeira, dentro de um copo gelado, umas bolinhas de massa recheadas de mel. Ao serem mordidas, deixavam cair uma calda dourada. Inesquecível! Por anos a fio tentei descobrir que doces eram esses.


     Talvez minha busca tenha finalmente chegado ao fim, pois dona Maria Cosson, quituteira das antigas lá de Xapuri e fiel depositária de tantas e tão boas tradições culinárias, concedeu uma entrevista recente durante a qual explicou que prepara esses doces por encomenda. Com grande generosidade, essa receita foi repassada para um emissário especial com a promessa inclusive de ser preparada na minha presença, o que espero seja feito em um futuro brevíssimo.



     Foi na rua que hoje abriga coloridas lojas e o Mercado restaurado que comi nem sei em que ano, meu primeiro cachorro-quente, num carrinho estacionado na calçada, quase noite. O toque de novidade, misturado à salsicha com verduras e molho de tomate no pão macio, fui descobrir muitos anos depois, numa lanchonete de cidade grande: era do cominho aquele cheiro inebriante, do tipo ame-o ou deixe-o. Depois que o descobri, nunca mais pude largá-lo.



Foi na Epaminondas Jácome que Patrycia comeu seu primeiro cachorro quente


     Assim como eu, toda a Humanidade conviveu e convive com as especiarias. Antes, nos séculos passados, eram utilizadas abusivamente, como forma não só de conservação dos alimentos, mas também demonstração de riqueza e poder. Hoje, consegue-se extrair delas o que tem de melhor, seja o sabor inconfundível, seja o perfume característico.


     Nesse baú sem fim de lembranças, não posso deixar de perceber a importância que a culinária sempre teve na minha vida: invariavelmente os grandes e pequenos acontecimentos estiveram e estão ligados, de uma forma ou de outra, aos sabores, cheiros, texturas e descobertas de novos pratos ou o reconhecimento familiar de outros tantos, que formam aquelas iguarias que constituem nossa história pessoal.


     Seja como sobrevivência, cultura ou prazer, através das receitas nós nos reaproximamos de nossos antepassados, nos reaproximamos de quem somos, estabelecemos uma maneira de ser, um modo de vida. Fazemos por fim as pontes com os amigos e com o mundo ao nosso redor, revivendo ou criando um espaço familiar e aconchegante.




Laurence Fishburne e Freddy Rodriguez no filme "Bobby"


     No filme “Bobby” (exibido recentemente pelo Cinemacre), que trata do assassinato do senador americano Robert Kennedy no Ambassador Hotel em 1968, o diretor Emilio Estevez conseguiu relacionar várias histórias paralelas vividas naquele dia. Dentre elas, a que mais me chamou atenção foi a do chefe de cozinha interpretado pelo ator Laurence Fishburne: ao servir sua famosa torta de morango, ele explica para os companheiros latinos o porquê das receitas iniciais da torta terem fracassado. Ele queria reproduzi-la da mesma forma que a mãe e a avó costumavam prepará-la, para lembrar delas através da comida, mas só conseguiu acertar quando juntou à receita sua própria experiência.


     O que procuramos na receita familiar, no encontro de amigos, é o sabor perdido lá atrás, de um tempo que foi passando e trazendo junto nossas melhores lembranças. Tempo de chupar laranja até ficar de barriga dura, esticada, deitados em varanda ou sob a sombra de uma árvore. Tempo do descompromisso e da liberdade, da cerca pulada para roubar goiaba…

   

  Bolo de Chocolate com café: exemplo de comidinha de alma…

  

     Nina Horta, chef, cronista e dona do Buffet Ginger em São Paulo, no seu livro “Não é sopa” já fala em "comida de alma", que reconforta, acalma, a que é igual colo de mãe. Por outro lado, nossa cozinha brasileira, infinita, plural, resultado de tantas culturas diferentes, foi de tal forma amalgamada que até mesmo nossa cozinha amazônica, tão autêntica, espelha essa mistura: afinal, de que mão portuguesa saiu o paio que começou a temperar a maniçoba?



Os filhos da Patrycia: o Mateus é fã do Strogonoff, enquanto o Ian prefere a Lasanha…


     Do “baião-de-dois” nordestino ao churrasco gaúcho, da feijoada que se come no país todo ao tutu de feijão mineiro, e aos peixes amazonenses, esse Brasil segue com dezenas de pequenos Brasis e suas receitas típicas e maravilhosas. E tem até mesmo as não-receitas, motivo pelo qual estou a escrever estas linhas e vou contar o "causo", pois não me pediram segredo: nos muitos anos que passei fora de Rio Branco, me meti a cozinheira por prazer e necessidade; afinal, para alimentar os "bruguelos" com comidinha da mãe, precisei comprar revistas e livros, cilindro de massa e forminhas diferentes. Já assei um bocado de bolo e fiz muito arroz com feijão. Ocorre que toda cozinheira que se preza não pode atender somente à sua prole e marido, portanto, para ser autêntica, terá que adotar mais alguns mortais: os amigos queridos utilizados como cobaias das experimentações culinárias.



     Com sorte e a depender da cozinheira, quase sempre esses amigos são brindados com várias comidinhas carinhosas. E numa destas experimentações, bem conhecidas dos mineiros, meti-me com umas cascas de limão que ao invés do destino previsível, foram despidas de sua parte branca e cortadas em tirinhas muito finas, postas de molho em várias águas, fervidas outras tantas e aí, depois de perderem qualquer amargor mais forte, foram banhadas várias vezes em calda de açúcar até se convencerem de que não há amargor que resista a tanto amor, ops, açúcar. 


 

   

     Nesta fase são, finalmente, colocadas para secar em peneira, quando então jogam-se as bichinhas em um prato de açúcar cristal, vira-se pra lá e pra cá e eis aí um petisco delicioso, que embaladinho em um saquinho de papel celofane com um laço de fita, ofertado para uns amigos do coração, fez com que um deles me pedisse pra contar a história. Quem disse que do limão só sai limonada?"

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

COMO ESCREVER UM BLOG SABENDO QUASE NADA DESSAS MARAVILHAS TECNOLÓGICAS


Em mar/2008 meu marido resolveu escrever um blog. A ideia seria reunir escritos sobre filosofia, política, arte, atualidades, enfim, escritos comprometidos com um planeta sustentável, com um mundo melhor. A publicação, além da internet, estaria em um jornal local, o Página 20. 

Em mai/2008 fui presenteada com um texto meu, escrito sobre memórias afetivas e culinárias, publicado na web e também em página inteira no jornal, em um ato de carinho e cumplicidade de meu companheiro, que me deixou com lágrimas nos olhos. Era o Dia das Mães, com café da manhã, presente e filhos e memórias que iam até a infância dos quintais, do mingau da mãe e dos biscoitos feitos até hoje por ela, delícia cobiçada por grandes e pequenos. 

Para nossa surpresa, as lembranças dos leitores explodiram junto com as minhas e só deu gente saudosa da comida da mãe, da avó, da tia querida...era um mundo de iguarias e carinho que só mostra a importância desse resgate, da comida de afeto, que conforta a alma. E então, um dos leitores amigos me sugeriu fazer um blog: falar de comida e resgate, de emoção e de receitas antigas e novas...demorou para sair e contei com o apoio incondicional do Marcos e do Denison,  nosso muito querido especialista em web, design e outros bichinhos. Também contei com o pontapé carinhoso da nossa querida sobrinha Iara. 

Por fim, ei-lo: estaremos construindo esse espaço juntos, os leitores e eu. Certamente, muitas receitinhas, histórias e conversas aparecerão por aqui e serão muito bem-vindas!