segunda-feira, 13 de agosto de 2012

O PRIMEIRO PÃO A GENTE NÃO ESQUECE

Pão integral com gergelim preto


Nunca tive aula de cozinha, mas cresci com os cheiros do pirarucu no leite de coco feito pelo meu pai e com o sabor do lombo cheio da minha mãe, recheado com uma farofa úmida e suculenta. Ainda pequena, duas coisas me deixavam absolutamente encantada: procurar livros para ler, fosse na vizinhança, nas casas dos amigos ou da família, nas livrarias ainda incipientes por aqui e também me aventurar nas panelas.

Receitas, eu não sabia. Mas minha mãe tinha um caderno onde eu às vezes lia algumas delas, passadas de mãe para filha e como eu lia tudo que me caía nas mãos, ficava viajando naquelas delícias. Lembro de uma coleção de livros de culinária da Tia Nair ou outra tia parecida, bem anos setenta, com os coquetéis de camarão, biscoitos e bolos e mais uma infinidade de petiscos.

Para mais da metade deles, faltavam os ingredientes. Era um tempero diferente, um legume desconhecido, frutas mais do que exóticas para quem naquela época, só conhecia de diferente as maçãs e uvas que aqui começavam a chegar, disponíveis em dias de doença, para fazer um agrado. 

Naquela época, como hoje ainda, gostava de presentear com biscoitos ou doces. Aos doze anos, aprendi a fazer um biscoito chamado casadinho, recheado com goiabada e desde então, vez por outra eu ia para a cozinha, produzir os famosos biscoitinhos. Nunca dava para quem queria e a receita perdeu-se com o tempo, embora fossem muito disputados na família. Era o casadinho que eu orgulhosamente levava para presentear os enfermos ou as mães de primeira viagem.

Uns anos depois, caí no movimento estudantil e aí não sobrava tempo para ser gourmet. Nos contentávamos com o macarrão com salsicha feito por uma amiga, para um bando de saudáveis esfomeados e muito leite com pão. Quando dava, íamos ao Casarão, livraria/restaurante/bar e nos deliciávamos com as comidas da Graça, até hoje bem vivas na memória: o contrafilé à parmegiana, feito com molho de tomate de verdade e a feijoada aos sábados, com uma farofinha crocante e banana frita de acompanhamento, além da couve sequinha, dos deuses. Se eu fechar os olhos, sou capaz até de encher a barriga com as lembranças.

E aí veio o primeiro filhote e comecei de verdade a cozinhar. Comida simples, só sabia fazer bem o arroz, aprendido com meu pai, com muito alho e soltinho, bife e maionese, batida numa tigela com gemas cruas e cozidas passadas em peneira e azeite misturado devagar. Umas gotas de limão, sal a gosto e legumes e verduras fresquinhos, cubinhos de maçã e umas passas, era comida de festa.

Mas, não perdi o gosto por ler receitas em revistas e livros de culinária, quando tinha chance. Havia tentado sem sucesso fazer uns pãezinhos de leite que foram muito bem até a primeira fermentação. Como eu não sabia que precisava fermentar de novo depois de modelado, arrumei as bolinhas na assadeira e forno nelas! É claro, viraram palanquetas especiais para qualquer baladeira e só faltei morrer de frustração.

Até que um dia, lá pelos idos de 1993, na banca de revistas em frente ao prédio da Caixa onde eu trabalhava, já no Ceará, botei o olho numa publicação sobre pães. Resolvi arriscar. Comprei a revista e em conversa com uma colega, descobri que ela, mineira, tinha uma empregada mãos de fada, que fazia um pão integral delicioso. Lembrem-se, o ano era 1993, nada desses empórios gourmet, farinhas especiais, orgânicos em todo  canto.

Até hoje guardo o papel com a receita, dividida por quatro: eu não queria perder todo o material em caso de erro, caro e difícil de achar. Comprei os ingredientes e assim que cheguei em casa comecei a fazer o pão, cruzando os dedos. Acho que lá pelas dez e meia da noite do mesmo dia, eu numa ansiedade louca pra ver se ia dar certo, coloquei o pão para assar. Lembro até hoje daquele cheiro maravilhoso tomando de conta da casa inteira. Não me contive e saí pulando pela sala, com umas fatias fumegantes na mão, cobertas de manteiga, derretendo e queimando a língua. Até hoje, faço a mesma receita de pão integral e já íntima, acrescento castanhas ou gergelim, açúcar mascavo ou mel, leite ou água. Só uma coisa não mudou: o sabor maravilhoso e o prazer de comer um pão feito em casa. Experimente você também!


A massa do pão, já fermentada... 

Pào integral com gergelim (opcional)

Ingredientes

1 1/4 de xícara de farinha de trigo branca (pode ir até 1 1/2 xícara, dependendo da umidade da farinha)
1 1/4 de xícara de farinha integral (pode ir até 1 1/2 xícara, dependendo da umidade da farinha)
1 colher de sopa rasa de fermento para pão
2 colheres de sopa de óleo vegetal (usei 1 colher de óleo de soja e 1 de gergelim, mas pode usar qualquer um)
2 colheres de sopa de mel (ou 02 colheres de sopa de açúcar mascavo, bem apertado na colher)
1 ovo
1 xícara de água morna (ou leite)
1/2 colher de sopa de sal marinho (se usar o refinado, um pouco menos)
Gergelim preto torrado, a gosto (opcional)
linhaça (opcional)
Nozes ou castanhas em pedaços pequenos, passas, pedacinhos de chocolate meio amargo (opcional)

Modo de Fazer

No liquidificador (ou se preferir, numa bacia média) coloque a xícara de água morna. Acrescente o fermento, o óleo, o mel e o ovo. Bata para misturar ou se for fazer na bacia, com um garfo. Deixe fermentar por uns quinze minutos, acrescente o sal e as farinhas, misturando devagar, até ficar uma massa maleável, que possa ser sovada. A depender do teor de umidade das farinhas, pode pegar um pouco menos ou um pouco mais. Se desejar, torre levemente o gergelim, espere esfriar um pouco e acrescente à massa. Podem ser utilizados os demais opcionais ou outros de sua preferência, juntos ou separados, em pequenas quantidades. Neste caso, usei apenas gergelim preto. deixe descansar até dobrar de volume na vasilha coberta com um pano de prato. Após, amasse ligeiramente e modele os pãe no formato que desejar. Arrume-os em assadeiras untadas e polvilhadas, espere crescer até dobrar de volume e coloque-os em forno já aquecido até que dourem ou até que ao dar uma batida no meio, o som saia oco. retire do forno e sempre coloque numa grade para esfriar, imediatamente, pois se ficarem na assadeira, vão juntar vapor e ficar moles na base. Deixe-os esfriar para guardá-los, mas só se você aguentar. Caso contrário, coma quentinho com manteiga, geléia ou requeijão.
Rende dois pães médios.  

9 comentários:

  1. Patrycia, fiquei com água na boca e com algumas dúvidas (que devem ser tolas, mas que para um cozinheiro iniciante são grandes):
    - "Deixe fermentar por uns quinze minutos, acrescente o sal e as farinhas, misturando devagar". Deixa fermentar dentro do liquidificador? E essa mistura posterior pode ser feita também no liquidificador? Qual a hora de passar para a vasilha?
    - "Arrume-os em assadeiras untadas e polvilhadas". Untadas com manteiga/margarina? Polvilhadas de quê?
    - "coloque numa grade para esfriar". Grade de quê? Pode ser qualquer superfície vadada, até uma tábua de cortar legumes ou carne?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Eduardo,

      Saudades. Vamos lá: os ingredientes líquidos,o açúcar, o ovo e o fermento são batidos no liquidificador (nesta receita). Após bater, despeje o conteúdo em uma tigela ou bacia, mas também pode deixar no liquidificador, só que vai começar a fermentar e grudar um pouco nas pás do mesmo, por isso é melhor despejar na tigela. Aguarde uns quinze minutos em dias quentes ou mais um pouco em dias frios, para que a mistura comece a fermentar. Após esse tempo, acrescente o sal, pois ele atrasa a fermentação. Em seguida, comece a colocar as farinhas, misturando com uma colher ou garfo e depois com as mãos, até formar uma bola macia que você vai esticar e enrolar de novo por alguns minutos.Após esse tempo,forme uma bola e deixe descansar na tigela, coberto por um pano até dobrar de volume. Esse processo demora de 40 minutos a 1h, depende do tempo (se mais quente, menos, se mais frio, mais).
      Quando a massa estiver bem crescida, deve ser despejada em um mármore ou mesa com um pouco de farinha, amassada levemente e moldada para fermentar a segunda vez, antes de assar. Você pode fazer uma bola, esticar como um retângulo e enrolar, formando cilindros ou fazendo pequenos pãezinhos ou mesmo colocando em uma forma para pão. A assadeira ou forma deve ser untada com manteiga (não gosto de margarina, mas se gostar, pode usar) e polvilhada com farinha de trigo. Dê batidinhas na forma para a farinha cobrir toda a manteiga.Arrume os pães na assadeira ou forma, deixando espaço entre eles (se arrumar na assadeira). Deixe fermentar por mais uma hora, até ficar bem crescido e só então coloque no forno, até dourar ou ao dar uma batidinha no centro, ouvir um som oco.
      Quando tirar do forno, é importante desenformar de imediato, deixando esfriar em uma grade (sabe grelha de assar?) ou então naqueles descansos para pratos vendidos no Mercado Central de Fortaleza, bem coloridos (acho que são de palha). É o que eu uso em casa. Isto para que ao esfriar, ele não crie vapor e fique molhado por baixo, deixando o pão mole. Espero ter conseguido tirar suas dúvidas, pois fazer pão é muito, muito prazeroso. Um beijão,

      Patrycia

      Excluir
    2. Grato pelos mí-ni-mos de-ta-lhes, Patrycia. Quando eu fizer o pão, lhe dou notícia. :) Beijo,

      Excluir
    3. Oba!
      Vou esperar, vai ser divertido colocar a mão na massa...nada de padaria Espiritual, né?
      Beijos,

      Patrycia

      Excluir
  2. Oi Patti, seu pão deu água na boca!!!! Bjs e saudades

    ResponderExcluir
  3. Oi Patti seu pão deu água na boca!! Bjs e saudades, Lilian

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Lílian,

      Muito obrigada, beijo para você também!

      Patrycia

      Excluir
  4. Pensa no pão delícia... eu como bem devagar para render mais ...

    Obrigado querida por tudo... Você é um exemplo de mulher.

    Juciele Belchior

    ResponderExcluir
  5. Oi, Ju,

    Você é uma pessoa querida...tô muito feliz de lhe ter por perto, você é muito especial! Amanhã os mandins vão para a panela, beijo!

    Patrycia

    ResponderExcluir